CAPÍTULO ONZE
Os dias se passaram, Karl veio visitá-los, e foi uma festa, em
tudo semelhante aos momentos mágicos vividos ao lado de Karine. Karl
contou dos seus progressos na pintura. Ele havia conseguido o apoio
de um grande mestre francês, e exibiria seus quadros numa galeria
famosa. Os pais ficaram orgulhosos. E, a despedida veio acompanhada
por novas e sentidas lágrimas, nem mais e nem menos sentidas do que
as vertidas por Karine.
Gibran prosseguiu nos estudos, conversando com o Mestre, ora
através do pêndulo, ora através das mensagens escritas. Helga
tornou-se a deusa das ervas, que se espalhavam ao redor da casa,
mesmo quando nem eram semeadas ou plantadas. Bastava que ela
expressasse o desejo de tê-las num lado ou no outro, e começavam a
brotar suas primeiras folhinhas.
Joseph falecera dois anos após eles terem mudado, e deixara muita
saudade, privando-os de seus conhecimentos e bom humor. Gibran já
fora duas vezes a Berlim para visitar a Loja da Sociedade Teosófica,
em busca de mais informações sobre Madame Blavatsky, que falecera
em Londres, pouco depois dele ter ido morar em Stuttgart.
Em suas visitas ao centro de Stuttgart, Gibran conhecera alguns
interessados no estudo da teosofia e da filosofia, e com eles passou
a manter encontros, todas as vezes que se deslocava em busca de
livros ou de correspondências. Durante os encontros, as conversas
versavam sobre as experiências de Gibran, envolvendo karma,
reencarnação, vidas passadas e poderes para se comunicar com o
Mestre.
O Mestre Saint Germain, na última mensagem, havia falado de uma
encarnação futura de Gibran, que aconteceria no Brasil, quando ele
e Helga dariam prosseguimento à vida de casal que já tinha tido
início há milênios e, pelo jeito, prosseguiria por muitas e muitas
vidas sem fim. Gibran estava interessado em obter informações sobre
o Brasil, e um dos novos amigos já havia viajado pelas terras
brasileiras, e se ofereceu a lhe falar sobre o que viu.
Gibran ouvia com atenção a descrição do amigo sobre a nova
república desde 1889, quando o rei descendente da nobreza portuguesa
foi deposto, e retornou para Portugal. O Brasil e Portugal
tornaram-se objetos de pesquisa de Gibran, e o amigo Peter o seu mais
próximo consultor.
Peter passou a visitar a casa de Gibran, e Helga, ciente da
mensagem que reencarnaria no Brasil em sua vida seguinte, crivava o
pseudoespecialista em terras brasis com perguntas que nem mesmo um
experiente historiador saberia responder. E, assim, um novo interesse
surgiu na vida do casal, para preencher suas vidas tão emocionantes
quanto amorosas.
Gibran prometeu a Helga que ia procurar saber com o Mestre Saint
Germain, ou através do pêndulo, tudo que fosse possível sobre onde
viriam a nascer, como se conheceriam e o que mais fosse possível
descobrir.
O tempo passava e os fatos se precipitavam, tornando a vida do
casal cada dia mais emocionante. Cada dia era um fato novo, uma
revelação inesperada ou um aprendizado inusitado. Eles não
saberiam explicar de onde surgiam tantas novidades e como
processá-las, sem tropeçar na fantasia ou na condenável ansiedade
de pôr a carroça na frente da égua, que é mais simpático do que
o carro na frente dos bois.
CAPÍTULO DOZE
Gibran lia, pesquisava e escrevia. Helga plantava, cuidava das
ervas e ouvia as histórias de Gibran. O tempo passava. Os amigos
foram surgindo aos poucos, trazidos por Peter, que se tornou íntimo
do casal.
Peter e Karol formavam um casal jovem e simpático. Cultos,
sociáveis e descontraídos, os dois transformaram a vida de Gibran e
Helga, acabando com o isolamento a que se tinham condenado desde que
chegaram a Stuttgart.
O tempo passava. As reuniões à noite, uma ou duas vezes na
semana, mantinham os dois informados dos acontecimentos na
vizinhança. Peter era biólogo, especialista na cultura de frutas.
Ele lidava com todas as famílias da redondeza, e participava de suas
vidas e plantações. Karol era uma tradicional dona de casa, ótima
cozinheira e hábil na costura.
Gibran, naquele momento, escrevia em seu diário secreto, como ele
o chamava. Aproveitemos a ausência dele, que foi atender a um
chamado de Helga, para tomar conhecimento do que prendia a sua
atenção.
Numa leitura rápida, chegamos ao terceiro parágrafo, onde Gibran
fala de suas experiências naqueles primeiros anos de vida no campo.
Confesso que interromperei a leitura, caso me defronte com alguma
anotação particular, cujo conteúdo deva ser preservado.
– A espiritualidade é um caminho muito árduo para quem se
propõe segui-lo. Ele começa com muitos sinais e diversas
expectativas, porém, à medida que vai sendo percorrido, o ritmo vai
decrescendo e as novidades vão desaparecendo, até que uma calmaria
irritante se instala na vida do caminhante. Em verdade, não é a
calmaria que irrita, mas a falta de respostas, ou quem sabe, de
perguntas, tornando os dias repetitivos, tendo como pano de fundo o
silêncio, onde antes se ouvia muito barulho.
– O erro é nosso, está dentro de nós. Tudo que incomoda é
uma ausência interior, já que externamente o mundo continua o
mesmo. Às vezes, sinto-me apático, diante da vida. No entanto,
quando falo ou escrevo sobre a espiritualidade, sobre a vida, sobre a
natureza, sinto-me cheio de entusiasmo, vibrante mesmo. Afinal, onde
está o erro? O que será que está faltando? Se é que falta alguma
coisa.
– Há cinco anos que estou envolvido pela magia de verdades
ocultas, por afirmativas sem comprovações no mundo físico, por
situações oriundas de causas intangíveis. Começou de repente e se
alastrou como uma fogueira quando encontra palha seca à sua frente.
Aprendi verdades impensáveis, passei a conhecer um mundo até então
desconhecido e lancei-me em busca de novidades. Talvez, esteja aí a
causa dos momentos por que venho passando. Tantos eram os fatos
desconhecidos no início da caminhada que, dia após dia, eu me
deparava com desafios novos, questões intrigantes que me despertavam
o sentido de busca.
– Chega um tempo que os fatos já não são desconhecidos, e
novidades, só de tempos em tempos. Só nos resta, o estudo. Mais
nada, além do estudo e da fé.
– Todas essas coisas, eu já sabia, já me haviam dito. Mas, a
personalidade é a grande traidora dos ideais da alma. E, por mais
que busquemos sintonizar nossa mente com a alma, a todo instante,
somos traídos pela força da matéria, que degrada os pensamentos
mais sutis, racionalizando-os e colocando-os a serviço do ego
inferior.
Gibran prosseguia na sua confissão ao diário. Mas, aqui nós
saímos fora, e deixamos preservada a continuação dos seus
lamentos. Colheremos esses lamentos mais adiante, durante a conversa
que ele terá com Helga, enquanto tomam uma xícara de chá bem
quente.
Helga havia perguntado ao marido, o que mais o preocupava. Ele
respondeu-lhe que se sentia como que apertado contra o tempo. Era
como se o espaço fosse reduzido, e mesmo assim precisasse
movimentar-se e realizar tarefas gigantescas, as quais ele não
saberia explicar quais eram, pois se passavam em outros níveis de
consciência.
Helga interrompeu-o para saber o que ele estava esperando receber
como mensagem do Mestre. Gibran disse-lhe que ele pedia sinais que
revelassem o seu trabalho. Os sinais não chegavam, mas ele se sentia
atrasado, sem saber para que.
Helga sugeriu que ele tentasse uma atividade que o distraísse
durante uma parte do dia. E, que, talvez, conseguisse obter algum
dinheiro, que sempre ajuda. Gibran balançou a cabeça, desconsolado.
Ele explicou a Helga que já vinha pensando nisto, tendo
conversado com alguns dos amigos que os visitavam. Muitas promessas,
nada de efetivo. Ele complementou afirmando que toda vez que buscava
trabalho para ganhar dinheiro, se punham barreiras na sua frente, e
ele não obtinha êxito.
Gibran deixou claro que não estava sofrendo e nem se sentindo
desanimado com a situação que eles estavam vivendo, nestes últimos
cinco anos morando distante de Berlim. Ele confessou a sua
felicidade, como jamais se sentira antes. Estava sentindo-se mais
forte e confiante do que nunca se sentira antes. Mas, um silêncio
interior o incomodava, e ele não sabia definir com segurança o que,
de fato, ele sentia. Não sei o que fazer, além do que já faço, e
nem sei se há algo mais a fazer, concluiu ele, a sua confissão.
Gibran resistiu à ideia de levar essa confissão mais adiante.
Mas, não se conteve, e por uma questão de hábito, baixou a voz
para revelar um segredo. Helga chegou-se mais perto, para ouvir que
ele estava recebendo mensagens que falavam de acontecimentos futuros.
Ela pensou que ainda se tratava da próxima encarnação no
Brasil, mas ele disse que não, que aquilo ele já deixara para trás,
pois de nada adiantaria pensar em algo que somente aconteceria na
próxima vida. Eram fatos que estavam para acontecer, e que diziam
respeito à vida que eles estavam vivendo.
Helga arregalou os olhos, e se preparou para ouvir. Ela adorava
mistérios.
CAPÍTULO TREZE
Gibran começou a sua revelação pedindo a Helga que não se
assustasse com o que seria dito. Ela não se conteve, e perguntou-lhe
se era alguma desgraça. Ele balançou a cabeça afirmativamente, mas
garantiu-lhe que eles estariam seguros em Stuttgart.
Gibran abre o seu diário, e lê para Helga a mensagem recebida do
mestre Saint Germain alertando-o para a proximidade de um sério
conflito entre a Alemanha e o império Austro-húngaro que resultaria
na que seria conhecida nos anais da história como a Primeira Guerra
Mundial.
O Mestre informava a Gibran que a guerra tinha sido a principal
razão de haver sido retirado de Berlim, e conduzido para Stuttgart
que seria preservada da violência das batalhas. Todo o histórico da
pré-guerra foi contado pelo Mestre, e a notícia final era que a
Alemanha seria derrotada.
Helga ficou chocada com o que ouviu. Ela pediu detalhes, esses não
foram revelados. Quis saber mais, e mais não existia para ser
contado. Ela, por fim, perguntou quando a guerra aconteceria. O
início ocorreria em 1914, e deveria durar até 1919.
As mortes, quantos alemães morreriam? Muitos, mas, não se sabia
quantos. Helga não conseguia parar de pensar, ela queria fazer
perguntas, mas, não conseguia concatenar as ideias, e assim, não
sabia o que perguntar.
Gibran acalmou-a, lembrando-lhe que ainda faltavam cerca de vinte
anos, e até lá o Mestre passaria outras instruções. Ela
tranquilizou-se, diante das palavras do marido, e passou a falar da
guerra futura com mais naturalidade. Então, chegou a hora de Gibran
demonstrar preocupação, pedindo-lhe que não mencionasse o que
ouvira para ninguém. Helga concordou com um gesto afirmativo, e sem
palavras.
Gibran deu a impressão que ainda havia o que contar. E, de fato,
havia mesmo, e Helga logo veio a comprovar. O Mestre falara de outra
guerra, ainda mais violenta, pois seriam usados armamentos que só
seriam projetados nos próximos 40 anos. E a Alemanha, perguntou
Helga, também estaria envolvida nesta outra guerra?
Gibran suspirou fundo, e respondeu que, não só envolvida, mas,
seria ela a provocadora da guerra, invadindo nações vizinhas e
tentando estender seus domínios por toda a Europa. Os detalhes foram
sendo passados, assim como ele os recebera do Mestre.
E, o pior é que nesta segunda grande guerra, Stuttgart estaria
diretamente envolvida, com prisioneiros judeus sendo aprisionados em
campos de concentração, e mulheres, velhos e crianças sendo
sacrificados. Gibran evitou maiores detalhes, ao perceber que Helga
estava perdendo muita energia.
Ele fechou o diário, e deu o relato por concluído. Helga tinha
os olhos cheios d’água, e abraçou-o como se pedindo uma prévia
proteção, com a antecedência de vinte anos. Gibran consolou-a, com
palavras e afagos. Ela adormeceu. E, era a noite de mais um dia.
A noite de mais um dia e, mais uma vez, a continuação desta maravilhosa história. E o caminho que vai projectando uma nova vida, desta vez no Brasil.
ResponderExcluirE os caminhos tortuosos, as dúvidas que surgem na senda da missão. O que falta? Como concretizar o que falta?
Esperamos desenvolvimentos nos próximos capítulos
Muitos abraços
Jorge
Meu inspirado amigo, Jorge Vicente:
ResponderExcluirComentários poéticos, numa prosa que valoriza e enobrece a minha história.
Abraço.
Gilberto.
Tantas coisas belas e permanecemos em silencio nos deliciando sem lembrar que o autor espera um retorno do leitor ...
ResponderExcluirComo a história guarda uma analogia do presente com o passado, venho refletindo na analogia que o passado possa estar nos revelando para o presente e os alertas que eles possam nos trazer...
Sim, amigo, João Sérgio, outra não é a minha intenção ao publicar esta história, do que o despertar na mente dos leitores, da magia do segredo dos mundos ocultos.
ResponderExcluirGrande parte dessa magia me foi revelada por meu mestre físico, que encontrei aqui em São Lourenço.
A outra parte veio a mim por revelações, que foram transmitidas por meu Mestre Espiritual.
O silêncio dos leitores não me incomoda, uma falta de continuidade na leitura, isto sim.
Os Iniciados precisam ler, para entenderem o que os Mestres lhes transmitem.
E a mensagem do Mestre não é numa linguagem simplória, como a trocada nos celulares.
Espero que os aprendizes caiam em si, diante dos desafio de entender o roteiro da obra.
Grato pela visita.
Abraço.
Gilberto.