quarta-feira, 7 de janeiro de 2015

TEIA AMBIENTAL - A MEDIDA DA ÁGUA



Meus caros leitores:
Às vezes, eu fico pensando que a inteligência humana está entrando em colapso.
É verdade que a ambição desmedida e a ganância por possuir cada vez mais, e só para si, deixa muita gente cega. Agora, tenho a impressão que depois da cegueira vem a loucura.
Durante quase todo o ano passado, só se lia notícias sobre a queda do nível dos reservatórios de água, a cada dia um novo percentual disponível. E quase sempre para baixo.
Os meios de comunicação publicavam que a situação estava crítica. Os governantes reclamavam da falta de chuva. As torneiras secando e o povo reclamando.
De repente, choveu uma semana no sul do país, cidades ficaram inundadas e águas foram lançadas aos rios e deles para o mar. Água doce que se misturou com água salgada dos oceanos. Água perdida para quem precisa de água doce para o seu consumo diário.
A cidade de São Paulo mede diariamente a sua reserva de água e publica o resultado. A cada baixa do nível do reservatório mais angústia e medo da seca. Providências, além de torcida e orações, nenhuma que revele de fato o desejo de solucionar o problema.
O Tesouro Nacional, tão enfraquecido por desvios e corrupções, parece ser a salvação. Planos e projetos envolvem milhões que não estão disponíveis. A sensação que se tem é que se trata de uma situação rotineira, uma espécie de solicitação de verba para a construção de uma rede de esgoto ou de um sistema elétrico.
A rotina burocrática empaca em prazos e orçamentos, enquanto se espera o milagre que não vem e a chuva que não cai. Será possível que algum brasileiro ainda acredita que o que acontece em São Paulo seja um problema que diga respeito apenas aos paulistas?
Está na hora de tomar atitudes a nível nacional. Precisamos parar de nos preocuparmos só com as represas para a construção de usinas e de plataformas de petróleo, e tratar de construir uma grande rede de transmissão de água, com tubulações de alta capacidade de vazão, que possam ligar o país de Norte a Sul.
Se por causa de faturar mais, são construídas tubulações pelo deserto para conduzir petróleo e gás, como não fazer o mesmo ou muito mais para abastecer as regiões mais secas. É claro que isto já devia ter acontecido com o Nordeste, mas quem sabe onde fica o nordeste do Brasil?
Seca nunca foi uma preocupação do Sul ou do Sudeste, mas agora é. O susto ou o pavor de alguns está tomando conta das grandes cidades paulistas, apesar da indolência da sociedade frente a necessidade urgente de encarar o problema sem perda de tempo.
Agora, não estamos falando mais do sertão mas do centro empresarial do país. Os retirantes sempre procuraram outras terras para fugir da seca, mas os grandes empresários não podem colocar a bagagem nas costas e abandonar suas fábricas.
A ironia maior é que esses mesmos empresários estão mais preocupados com a corrupção na Petrobrás, em que muitos deles estão envolvidos, do que em cobrar dos governantes uma prioridade absoluta para uma grande obra contra a seca, que, tudo indica, terá vida longa.
Uma transposição absurda do rio São Francisco para atender os interesses dos agronegócios consome milhões e não parece assustar governantes e banqueiros. Por que não pensar num projeto semelhante que possa distribuir a água entre os grandes reservatórios naturais e as diversas regiões do país? Por que não levar adiante um grande projeto de coleta de água da chuva, em alta escala, canalizando tudo que transborda e inunda cidades e desaguando em enormes reservatórios? Cada cidade poderia ter o seu sistema próprio, interligado aos demais.
Diriam os economistas que isso é uma fortuna, e é mesmo, porém, fortuna bem empregada. Diriam os fatalistas, mas isto seria mais um motivo de corrupção, e pode mesmo ser, desde que não se fiscalize. Ou a situação é emergencial ou não se fala mais nisso. Nem se olha para o céu e nem se faz promessa.
O que não se pode admitir é este ridículo ritual diário de anunciar a redução do nível da Cantareira, ou de outro reservatório qualquer. Parece pregação da Bolsa que só cai, e nunca sobe.
A sensação que a gente tem é que, um dia, após a medição, virá a aguardada, porém temida notícia, que o reservatório secou. E agora, como enfrentar a nova grande depressão, com a quebra não de bancos, mas de reservatórios de água?
Na depressão financeira, muitos morreram por se suicidar, agora, morrerão de sede. E, de braços cruzados, muitos aguardam a nova medida da água. E suspiram se ainda restam algumas gotas a mais.
E as causas, quando serão atacadas? E as atitudes imediatas, a partir de quando? Lenta e inexoravelmente, gota a gota, a água vai desaparecendo. A maioria torce por mais uns pingos de chuva, muitos rezam e pedem aos santos e uma minoria sorri calada, fazendo planos para novos negócios que explorem a crise da falta de água.
Como é possível ter projetos para tudo, e não ter recursos para matar a sede de um povo? Como é possível discutir-se empreendimentos para tornar o país mais rico, se não se tem dinheiro para saciar a sede da nação sedenta por um gole de água.
Chega de publicar diariamente a medida da água. Não interessa a ninguém, se tem mais meio por cento ou menos um por cento, quando o resultado final será a definitiva escassez de água. A propósito, qual é a medida da água, na tarde de hoje? E qual é a previsão de chuva? Acho melhor irmos todos à igreja.