segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Economia x Ecologia : o jogo do futuro

SEGUNDO TEMPO : o número 7 contra-ataca

Durante todo o primeiro tempo desse jogo, o número 8 controlou as ações e domi
nou o jogo.
Agora, estamos jogando o segundo tempo, e a reação do número 7 pode ser observada e sentida por todos os participantes e assistentes.

O poder de ataque do número 8 começou a fraquejar com a constatação de que todas as riquezas têm as suas origens nos recursos naturais e na energia extraída desses recursos. E à medida que esses recursos se tornam mais escassos, as matérias-primas e a energia elétrica têm de ser extraídas de reservas que já se encontram por demais exauridas e cada vez mais inacessíveis, o que exige um volume crescente de capital para os processos de exploração.
A redução dos recursos naturais acarreta uma natural ascensão dos preços desses recursos e da energia indispensável à produção industrial, dando origem a uma das
principais fontes geradoras do processo inflacionário.
Como a economia moderna depende de um volume excessivo de energia e de recursos naturais, por ser uma economia de capital intensivo, o custo dessa política econômica está tornando-se cada dia mais oneroso e inflacionário.
À medida que os recursos naturais escasseiam, em decorrência dos processos
de extração e exploração não-renováveis, o próprio capital vai tornando-se escasso. Mas, mesmo assim, a economia mundial tem insistido na substituição do trabalho pelo capital. E, com isso, o dinheiro se torna mais caro, enquanto cresce o desemprego.
Os governos, influenciados pelos poderosos detentores do capital, prosseguem incentivando os grandes investimentos, numa pretensa política de geração de novos empregos. Na prática, no entanto, o que se observa é o exagerado crescimento dos lucros das megas empresas, apoiadas em modernas tecnologias, que dispensam, cada vez mais, o emprego da mão de obra. A solução para o desemprego acaba por se tornar a realimentadora do processo que promove a constante e lamentável dispensa do uso de mão de obra.
Acontece que, a longo do prazo, a economia de capital intensivo, por empregar intensivamente os recursos naturais e a energia extraída da natureza, acaba por se tornar altamente inflacionária, e contribuindo para as crises econômicas que afetam drásticamente o mercado de trabalho.
Os economistas, porém, insistem em conceitos absolutamente ultra
passados, em que o excessivo emprego do capital, em detrimento da maior utilização da mão de obra, provoca esses viciados efeitos inflacionários, deixando o mercado de trabalho sob constantes ameaças.
A dependência exagerada do capital, da energia e dos recursos naturais seria a causa mais visível da inflação, e deveria ser considerada a variável ecológica da inflação. Uma segunda causa, tão séria quanto a primeira, ficaria por conta dos custos sociais, em decorrência do obsessivo e utópico crescimento econômico ilimitado, que seria a variável social da inflação.
Na tentativa de maximizar seus lucros e atingir sempre maiores níveis
de progresso, as pessoas, as empresas e as instituições públicas procuram excluir de suas contas, os custos sociais e ambientais.
O mais comum é não assumir esses custos, e empurrá-los para os outros, transferindo-os para as contas públicas, para o meio-ambiente e para as gerações futuras. Com isso, os orçamentos públicos estão sempre ocupados com investimentos em áreas que
buscam corrigir as distorções sócio-econômicas, e que em nada contribuem para a produção em si, e que só servem para gerar mais inflação.
Avolumam-se os custos para se consertar todo o estrago que o sistema provoca com suas ações dissociadas das cautelas ambientais e sociais. Os volumes absurdos de dinheiro disponib
ilizados para cuidar das vítimas desses descasos ambientais e sociais são custos sociais altamente inflacionários. A necessidade de prestar assistência aos desempregados, que foram substituídos pelas máquinas, financiadas pelos órgãos estatais de desenvolvimento industrial, é outro fator inflacionário patrocinado pelo próprio Estado. E ainda temos de somar a tudo isso, os desastres ambientais, provocados pelas ocupações desordenadas dos centros urbanos, por diques ou represas que transbordam, por rios que invadem as cidades mal planejadas, destruindo casas e matando inocentes, e a seca nos campos, onde antes existiam florestas e rios cristalinos.
Contabilizando todos esses custos, chegaremos a uma triste conclusão, que se gasta mais tempo e dinheiro para consertar o que se estragou do que para produzir bens e serviços úteis.
As crises econômicas vão muito além de tudo isso, por envolver
em interesses de empresas e governos, misturando política e investimentos altamente lucrativos. Os prejuízos dessas empresas estão, quase sempre, comprometidos com projetos governamentais, nos quais os Governos acabam por ter de injetar dinheiro do povo para cobrir prejuízos fraudulentos dessas empresas, com a desculpa de evitar-se um colapso econômico, inflacionário e prejudicial ao mercado de trabalho.
Muitos alegam que não tem jeito, não há como mudar. Só não se muda, se não se quiser mudar.
A solução não é simples, por envolver mudanças de hábitos, costumes e sistemas. A economia teria de ser descentralizada, como, por exemplo, com o fim de uma moeda única de troca, como acontece com o comércio em dólar. As tecnologias desenvolvidas não mais poderão ser agressivas ao meio-ambiente, nem a exploração dos recursos e da energia poderão continuar a se basear na falsa premissa de crescimento industrial ilimitado. A meta seria encontrar o equilíbrio ideal para se lidar com o capital, a mão de obra, os recursos energéticos e naturais e a pr
eservação de áreas verdes e mananciais de água potável.
Os índices econômicos, para se medir o progresso de uma nação,
teriam de se ajustar a essas novas realidades, levando-se mais em conta o desenvolvimento sustentável, com o uso de energias alternativas limpas, e a ocupação da mão de obra como fator tão importante quanto o capital investido.
O país que melhor utilizasse a tecnologia moderna, sem a dispensa ou redução da mão de obra, adotando um meio-termo ideal, seria visto como o mais progressista para o seu povo, em função de uma melhor qualidade de vida, ainda que se confrontasse com os atuais e tradici
onais índices econômicos.
Dentro desse mesmo critério, seria valorizado o país que adotasse uma legislação preservacionista, zelando por suas florestas, cuidando dos seus mananciais e redistribuindo a sua população entre o campo e a cidade.
Essa tese que pode parecer utopia, na visão ambiciosa dos banqueiros e dos dirigentes das grandes multinacionais, tem a seu favor os relatórios científicos que previnem sobre os sérios desastres ambientais que se prenunciam, diante das atividades devastadoras do homem contra os recursos naturais do planeta.
A única solução virá da inter-relação do sistema econômico com os conceitos ecológicos, numa abordagem sistêmica em que tudo está relacionado, no que o F
ísico Fritjof Capra denomina de teia da vida.
Dentro desses mesmo princípio, o ideal seria que os nossos economistas passassem a enxergar a economia como parte de um sistema vivo, constituído de seres humanos e instituições sociais, em constantes interações com os ecossistemas ao seu redor.
As relações de causa e efeito, lineares e newtonianas, usadas no passado, teriam de ser abandonadas. Os conceitos de progresso ilimitado e desenvolvimento a
todo custo deveriam ser definitivamente desconsiderados.
A teoria dos sistemas, defendida pela física quântica moderna, afirma que as estratégias bem sucedidas num determinado estágio podem tornar-se totalmente inadequadas, numa outra situação.
Essa dinâmica não-linear traz à discussão a questão da reciclagem e do reaproveitamento de tudo que antes era considerado lixo, e jogado fora, despejado em "outro lugar", longe da nossa casa, da nossa loja, da nossa indústria e da nossa cidade ou país. Acontece que, dentro da concepção sistêmica, o que existe é a biosfera global, interligand
o todos e tudo. E, dessa forma, um "outro lugar" não existe.
Sob o aspecto econômico, a visão sistêmica nos ensina que não existe o lucro fortuito, ou ele sai do bolso de alguém, ou é obtido às custas do meio-ambiente ou será transferido para as gerações futuras.
E esses conceitos acabam com o sonho do lucro crescente e ilimitado, que é a grande ilusão dos sistemas lineares, ainda adotados pelos economistas. As flutuações econômicas seguem princípios não-lineares, de processos cíclicos contínuos de ascensão, apogeu e queda. Pessoas, métodos, atividades e, inclusive, empresas nascem e morrem, para renascerem
mais adiante com novos conhecimentos e experiências, adquiridos nos ciclos anteriores.

O desprezo pelo trabalho mais simples e mais duro tornou-se um consenso, uma verdade óbvia que não merece discussão ou reflexão. No início da Revolução Industrial, atraía-se essa mão de obra não especializada com promessas de bons salários, benefícios sociais e progresso profissional. Com o passar do tempo e com o surgimento das novas tecnologias, o capital foi tomando conta da situação e ocupando espaços que, antes, pertenciam exclusivamente ao trabalhador. Até que chegamos nesta encruzilhada entre o progresso e a própria sobrevivência.
Estamos vivendo, porém, o limiar de uma grande revolução nos paradigmas de progresso, que envolverão mudanças em métodos produtivos e em hábitos de consumo, para a superação da futura escassez dos recursos fornecidos pela natureza.
A base dessa revolução é a constatação de que esses recursos naturais nem são ilimitados, nem são gratuitos. O ar que se respira, a água que mata a nossa sede e a terra que nos fornece os alimentos estão exigindo investimentos cada vez maiores, para continuar ofertando o que, antes, julgava-se ser de graça.
Tudo começou a ficar mais caro, quando a mão de obra foi desprezada e substituída pelo capital, e o trabalho deu lugar à especulação financeira. Ninguém mais quer trabalhar, mas só viver de renda. Mas, quem produzirá o que se precisa consumir ?
A realidade, que todos terão de aceitar, é que ou o homem muda a sua relação com a natureza, ou a natureza mudará a sua relação com a humanidade. A humanidade está em débito com o planeta, por ter sacado a descoberto, um volume de riquezas que, a curto prazo, não tem como pagar.
Essa dívida está sendo cobrada de um modo mais intenso, nesses últimos tempos. E como os bons economistas sabem muito bem, quem não paga as dívidas, perde o crédito. A humanidade está sem crédito, e para recuperá-lo terá de trabalhar muito, e isso demandará tempo.
Economia sem ecologia não terá mais sentido num futuro muito próximo.

O número 7 reagiu no segundo tempo, fez belos contra-ataques, mas o jogo ainda não terminou.
O vencedor não poderá ser nem um, nem outro, mas a humanidade como um todo. O progresso econômico terá de ser ecológico. A ecologia terá de ser econômica. Não se pode destruir a natureza, para justificar crescimento e progresso. E nem se pode abrir mão da ciência e da tecnologia moderna, para se retornar à idade da pedra.

Ainda tem jogo, ainda falta tempo para o jogo terminar.
Nós vamos vencer !

Nota do autor : Os dados e muitas das informações utilizados neste texto foram extraídos do livro Sabedoria Incomum, de Fritjof Capra, e fazem parte da sua entrevista com a escritora e estudiosa da economia internacional Hazel Henderson.




2 comentários:

  1. "A realidade, que todos terão de aceitar, é que ou o homem muda a sua relação com a natureza, ou a natureza mudará a sua relação com a humanidade." - O Próprio Homem se conduz a isso, a Natureza está reagindo e vai continuar a reagir , a solução só vem com a união de pessoas para colaboração de um todo , A natureza pode parecer inferior mas quando mexem com esta ela mostra suas forças em nossos próprios feitos , O que Fazer !? A chave é o Amor e a união de Todos , Basta Querer Para Poder .

    Abraços . .
    JFabricio. .

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  2. Mais uma vez, José Fabrício, uma boa conclusão para temas humanos. Agora, precisa procurar ler e estudar bastante, para também ter suas próprias opiniões sobre os mistérios da alma.
    Um abraço.
    Gilberto.

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