CAPÍTULO VINTE E CINCO
Gibran defendia suas ideias com entusiasmo, e, vez ou outra, era
interrompido com aplausos de uma plateia atenta e participativa. Os
diretores não se sentiam muito confortáveis, mas nada comparado com
os incômodos das autoridades, que se mexiam nas cadeiras e retorciam
as mãos, denunciando a aflição que lhes ia na alma.
A escola precisa ser aberta, livre e democrática. O professor tem
que rever seus métodos, e a Secretaria precisa mudar o processo e a
forma de lidar com os alunos. As autoridades não podem continuar
insistindo em passar adiante matérias ultrapassadas, que não mais
correspondem à realidade moderna. Os pais serão forçados a
reconsiderar esta ansiedade de querer fazer de seus filhos senhores
doutores, famosos e ricos, trocando-a por uma visão mais equilibrada
de torná-los sábios e felizes.
A sociedade precisa parar de medir o valor pessoal pela riqueza,
ou pela fama e poder. Cada qual vale pelo que é, e tem o seu próprio
valor. Temos missões específicas a cumprir, que são nossas, e que
só nós devemos cumpri-las.
Temos de aprender a sintonizar a mente com a Fonte inesgotável de
saber e poder, como fizeram os grandes mestres, em diversas áreas
distintas, como Einstein, Shakespeare, Pitágoras, Platão, Beethoven,
Da Vinci, Wagner, Miguel Ângelo e tantos outros.
No final de sua fala, Gibran deixou uma pergunta no ar: “até
quando vamos continuar a nos enganar, fazendo de conta que assim como
está vamos atingir um estágio em que as escolas formarão cidadãos
que acabarão com a miséria e a violência?” Todos nós temos o
dever de buscar resposta para esta pergunta, que há de definir o
futuro do nosso país.
Num último arroubo de entusiasmo, ele desafiou os pais a
respeitarem as opiniões de seus filhos, e não os tratarem como
mercadorias que terão um preço quando adultos. “Filhos respeitem
seus pais, pois não é deles a culpa pelo vazio de suas vidas.
Mestres respeitem sua missão, pois nada é mais sagrado do que
mostrar o caminho a um discípulo. Governantes respeitem seus
cidadãos, lembrando que eles não precisam de favores, mas de
oportunidades e de senso de justiça”.
– Senhores e senhoras, agradeço a atenção de todos. Não me
cobrem soluções, pois não vim aqui para trazer respostas prontas,
mas para levantar problemas. Espero que se ponham a buscar respostas
para os tantos problemas levantados. Que surjam não as minhas
soluções, nem as suas, nem as deles, mas as nossas, que sejam
ideais comuns de todos nós.
– Meditem sobre o que lhes falei, e não se desculpem e nem
acusem. Nós somos a solução, mas também o problema. Nós somos a
mudança, mas também a estagnação e a omissão. Nós somos o
ontem, mas precisamos nos transformar no amanhã. Não somos vítimas
e nem culpados, nós somos os semeadores do amanhã.
CAPÍTULO VINTE E SEIS
A plateia, por alguns segundos, manteve-se em silêncio. As mentes
precisavam de um tempo para se refazer do impacto sofrido pelas
palavras do nosso semeador. A sensação é que o salão, de repente,
ficou vazio, ainda que nele permanecesse todo aquele povo inerte.
Aos poucos, como a um sinal convencionado, começaram os aplausos,
que foram crescendo até se tornarem ensurdecedores. Das alas mais
jovens, vinham gritos e assovios. Os mais adultos contentavam-se em
bater palmas.
As pessoas, sem cessar os aplausos, começaram a se levantar e
caminhar em direção ao palco. Todos queriam falar, opinar, serem
ouvidas. O palestrante foi cercado e cumprimentado, e, por muitos,
abraçado.
As autoridades fizeram menção de se levantar, mas a mediadora
reassumiu o comando dos trabalhos, solicitando a todos que voltassem
para seus lugares e permanecessem em silêncio. Ela agradeceu ao
nosso semeador pelo brilhantismo de sua fala e abriu os debates em
torno das questões abordadas.
As perguntas se sucediam, e eram respondidas com esclarecimentos e
sugestões. A plateia, a cada comentário, aplaudia de pé, enquanto
as autoridades se entreolhavam, sem saber o que fazer.
Os pais de alunos exigiam reformas, o prefeito e seus secretários
preocupavam-se com a próxima eleição. O governante e seu
secretariado contavam os votos, buscando identificar o número de
jovens com mais de 16 anos.
Apreciando aquela cena, os nossos semeadores sorriam, conscientes
que faziam o seu papel de semear ideias em terreno fértil. As
autoridades estampavam um sorriso amarelo, quase que assumindo todos
os erros apontados por Gibran.
O secretário de educação, convidado a dar o seu parecer, abriu
a boca, mas teria sido melhor se tivesse permanecido calado. Falou
pouco, e desagradou a muitos. Ele deu voltas, rodeou os problemas e
não teve coragem de apontar soluções.
O corporativismo no serviço público é tão obsessivo que, mesmo
não sendo acusado, o indivíduo se defende. Tudo em nome da classe
política, ou, talvez, do que se convencionou denominar ética
profissional.
A ética, que tanto se alega, quando se cobra uma opinião de um
governante ou político, não passa de um artifício de quem tem
telhado de vidro, e que tem medo de atirar um cisco que seja no
telhado do vizinho.
Assim fez o nosso Secretário. Desculpou-se como se fosse ele o
acusado. Desculpou, da mesma forma, o Prefeito. E, por fim, quis
tirar a culpa das autoridades responsáveis pelo ensino no país.
Ora, então quem deve ser chamado às falas? Quem deve responder aos
reclamos populares?
Enquanto nos ocupamos dessas divagações, o Prefeito pediu a
palavra. E, naquele tom discursivo, típico de campanhas e palanques,
prometeu uma reforma municipal no ensino. O povo gritou o seu nome, e
ele acenou para a plateia. Os nossos semeadores sorriram, certos que
no dia seguinte a promessa cairia no esquecimento.
Havia chegado a hora dos agradecimentos finais e das despedidas. A
plateia aplaudiu com toda educação a todas autoridades, mas
reservou um entusiasmo maior para os nossos semeadores.
Muitos saíram-lhe ao encalço, mal eles deram os primeiros passos
em direção à rua. No outro canto, o prefeito e sua trupe saíam de
mansinho, quase sem ser notados. Com eles, lá se foram a
incompetência administrativa e as tramoias políticas.
Nossos semeadores trataram de adubar a semente que haviam acabado
de plantar, indo em direção ao Prefeito, estendendo-lhe a mão e
parabenizando-o pela atitude corajosa de assumir publicamente a
reforma no ensino da cidade.
O Prefeito agradeceu, o Secretário de Educação se encolheu. No
agradecimento de um e no silêncio do outro escondiam-se os segredos
das promessas e das incompetências para cumpri-las. Muitas ações
não se concretizavam por absoluta falta de vontade política, que
pode ser entendida como desconhecimento ou descaso pelos interesses
do cidadão.
O perfil do político é este mesmo, ele só tem olhos para sua
própria imagem, que costuma projetar num espelho mental, diante do
qual vive a se admirar. E quando algo não ocorre ao jeito dele, é
um tal de articulações, acordos, manipulações e especulações,
em busca de manter o poder a qualquer custo.
O que importava é que as sementes haviam sido lançadas em
terreno fértil, levando os alunos a cercarem o casal, com ideias e
propostas de mudanças. Os diretores e professores, inspirados
naquelas propostas, começaram a projetar planos a serem discutidos
no dia seguinte.
Os fatos se repetem, de tempos em tempos. Os governantes perdem o
trem da história, só preocupados com votos, eleição e distorcidos
princípios de fidelidade partidária. Enquanto isto, a sociedade
traça o seu destino, e deixa para os políticos a conta a ser paga.
CAPÍTULO XXVII
No ano seguinte, um novo Prefeito foi eleito, graças a
compromissos sérios, estabelecidos por pressão do eleitorado. Por
trás da relação de cobranças, encontrava-se o casal de
semeadores, assessorando a população e orientando todos os
candidatos a assumirem compromissos que dessem novas esperanças aos
seus eleitores.
Não podemos dizer que venceu o melhor, mas pode-se afirmar que os
três candidatos mostraram-se conscientes dos compromissos assumidos
em seus discursos, deixando para o povo a escolha de sua preferência.
Nos quatro anos seguintes, a cidade progrediu como nenhuma outra
no país, tornando-se referência como padrão de administração
pública. A educação municipal passou a ser seguida pelos quatro
cantos do país, os novos métodos de assistência social e os
elevados padrões de saúde foram copiados pelas capitais dos
estados, chegando a Brasília e aos Ministérios.
As autoridades queriam saber o que acontecera com aquela pequena
cidade, e quem fora responsável pelos novos métodos de
administração pública. Mas, quando procuraram os semeadores, não
os localizaram. Eles desapareceram, e ninguém sabia informar o
destino que haviam tomado.
A história daquela cidade virou uma lenda, que inspirou as demais
a seguirem seus passos. Os inspiradores dos novos métodos não foram
mencionados, pois os políticos tomaram seus espaços, e se
vangloriavam de suas capacidades administrativas.
Quem se importava com um casal simples, que não almejava
distinção e glórias? Quem seria capaz de mencionar seus nomes,
como verdadeiros responsáveis por todas as benfeitorias celebradas
pelas lideranças políticas? O bom senso e os interesses políticos
recomendavam o silêncio, e logo tudo caiu no esquecimento.
CAPÍTULO XXVIII
Gibran e Helga haviam cumprido a primeira parte de sua missão, no
Brasil. Muito mais havia a realizar, e eles não podiam perder
tempo. Assim, embarcaram no tempo.
CAPÍTULO XXIX
Quando se procura relatar a história da nação brasileira, há
um vazio no preâmbulo que trata do momento exato e das razões que
fizeram com que a nação desse um salto para o futuro. Milagre
brasileiro, era como as nações estrangeiras tentavam justificar o
ocorrido.
CAPÍTULO XXX
Nada de milagres! Nada de mistérios! Um pouco de mistério para
quem não crê no poder dos Mestres, não se pode negar. A verdade,
porém, para quem sabe do poder do casal, além deste narrador, e que
são poucos, é que tudo foi obra dos semeadores do amanhã.
FIM
Chegamos ao fim de Semeadores do Amanhã e ao mesmo tempo descobrimos que ‘’ Gibran e Helga haviam cumprido a primeira parte de sua missão, no Brasil... e embarcaram no tempo’’. Acaba-se a história e a saga desses dois desbravadores, mas fala-se que essa foi a primeira parte da missão aqui no Brasil. Então, haveremos de ter outra aqui no futuro?
ResponderExcluirO enfoque final foi no aspecto educação, mas com uma abrangência que envolvia mudanças de paradigmas na administração pública, com reflexos nas áreas de assistência social e saúde. Eles conseguiram plantar e tiveram a oportunidade de ver a germinação, o crescimento, a floração e os frutos. Depois foram-se embora, saindo, como se diz por aí, de fininho.
Vimos nos noticiários agora no final de ano que o Governo está promovendo as modificações na Base de Formação Curricular para o Ensino Fundamental e Médio. São propostas que tentam inovar, mas distantes do que propunha Rudolf Steiner e de tudo aquilo contido no discurso de Gibran.
E nos dias de hoje constatamos que a distância em que nos encontramos desse ideal proposto por Gibran é praticamente inatingível, uma proposta quase utópica. Nosso modelo educacional perdeu conteúdo ao longo dos anos devido a uma proposta de um ensino sem muita cobrança, não reprovando quem não foi capaz, deixando de preservar nossa língua pátria ao tolerar expressões errôneas do tipo ‘’nóis vai’’, criando alunos incapazes de ler sem compreender.
Nós que aqui ficamos podemos fazer parte desse processo de transformação de nosso país, muito embora saibamos que há uma estrada a percorrer.
Talvez devêssemos pedir: Volte Helga! Volte Gibran!
Meu caro, Avelino:
ResponderExcluirNão esqueçamos que, Gibran e Helga são nossos semeadores, e não colheitadores.
A missão deles foi cumprida, uma outra ficará por conta dos que vierem depois, e seguirem o que eles deixaram semeado.
Agora, a próxima vez que ouviremos falar deles será num tempo muito distante, em que serão os construtores de um novo mundo.
Nós teremos de ter paciência e aguardar novas notícias do casal.
Até lá, eu trarei algumas histórias que falam de situações misteriosas e de outros planos.
Aguarde.
Abraço.
Gilberto.
E assim as histórias, os caminhos, os novos descobrimentos se fazem. E se constrói a Educação do futuro.
ResponderExcluirEsperemos novas histórias destes semeadores / construtores amados.
Um abraço a todos
Jorge Vicente
Sim, meu querido Jorge Vicente, a vida é assim mesmo, hoje, tudo parece muito claro, ontem só imaginações, amanhã, meras recordações.
ResponderExcluirQuem aprendeu com a sua vida, está pronto para uma próxima encarnação, quem se preocupou mais com a vida alheia, vai ter de refazer muitos e infinitos caminhos.
Gibran e Helga percorrerão muitas realidades e experiências desconhecidas, antes de voltarem a se manifestar sobre seus novos mundos.
A paciência será nossa companheira, enquanto o futuro se materializa em nosso caminho.
Prometo continuar a relatar-lhes a história do casal, em sua próxima e derradeira aventura.
Enquanto isto, vamos relembrar histórias que falam de Planos bem mais sutis do que este nosso.
Abraços.
Gilberto.